A VELHA E SAUDOSA SOROCABANA
Numa época em que o volume de notícias não era tão grande, os jornais abriam espaço para uma série de acontecimentos ligados ao cotidiano das pessoas. Isso ocorria tanto nos grandes matutinos e vespertinos das capitais como nos pequenos jornais interioranos.
O nosso A Voz do Povo não fugia à regra. Vamos, pois, encontrar em suas páginas registros sobre nascimentos, falecimentos, compromissos de noivado, casamentos, formaturas, exames escolares, embarque e desembarque de passageiros na estação ferroviária local.
A estação de Ourinhos possuía um movimento muito grande, nos horários de partida e de chegada dos trens de passageiros.
Três ferrovias serviram Ourinhos: a Sorocabana, a São Paulo-Paraná (inglesa) e a Paraná-Santa Catarina (que demandava Curitiba).
Meu avô, que se levantava muito cedo, ia diariamente à estação para ver a chegada do trem (Ouro Verde, Prata) que chegava de São Paulo, uma viagem que durava de 9 a 10 horas.
Após uma longa fase de utilização da locomotiva a vapor (a Maria Fumaça), a eletrificação da Sorocabana foi se dando paulatinamente, vindo a atingir Ourinhos em 1959; a operação completa só foi concluída em 1961.
Já nos anos 30, documento da ferrovia apontava para as dificuldades com a obtenção dos combustíveis básicos do trem a vapor - a lenha e o carvão:
Em 1937 consumiu a Sorocabana nos seus trens 1.296.000 m3 de lenha, além de 70.200 toneladas de carvão estrangeiro e 4.700 toneladas de carvão nacional.
Em 1938 o consumo de lenha atingiu a 1.580.000 m3, além de quase 60.000 toneladas de carvão estrangeiro e 15.400 toneladas de carvão nacional.
Para a própria lenha a solução do reflorestamento está sendo abordada pela Sorocabana, mas será uma solução demorada e problemática
A solução radical se nos afigura a da eletrificação dos trechos de mais intenso tráfego.
(Fonte: Acrísio Pais Cruz, diretor da E.F. Sorocabana ante-projeto de eletrificação, 1939, citado em A Eletrificação da Estrada de Ferro Sorocabana http://www.efbrasil.eng.br/electro/efs.html Webmaster: Antonio Augusto Gorni )A segunda estação de Ourinhos era muito bonita (a primeira datava de 1908), como demonstram inúmeras fotos que ainda existem (fora construída em 1926). Dela partiam, também, os trens que demandavam o norte e o sul do Paraná, tendo sobrevivido até os anos sessenta quando, devido ao aumento do transporte ferroviário, edificou-se uma estação com uma plataforma ainda maior, porém, sem a beleza da anterior. É o prédio que ainda hoje se encontra na Praça Henrique Tocalino.
O jornal A Voz do Povo possuía uma seção denominada OS QUE VIAJAM , ou seja, destacava um repórter para ir diariamente à estação para anotar os nomes dos moradores que embarcavam e desembarcavam:
11/2/1934
Regressou de Botucatu o Snr.João Mori e exma família.
Viajou para São Paulo, o Snr. Hermenegildo Zanotto, agente da Ford nesta cidade
29/4/1934
Para Pocinhos do Rio Verde, viajou o Snr. José das Neves Júnior, comerciante nesta.
13/5/1934
Seguiu para São Paulo, acompanhado de sua gentil filha Alba, o Snr. Ítalo Ferrari.
30/121934.
Regressou de sua viagem de núpcias o Snr. Oswaldo Milani e sua esposa Snra. Nita Mori Milani.
A Estrada de Ferro Sorocabana foi incorporada a uma nova empresa criada em 1971 a FEPASA Ferrovia Paulista S.A., criada com a finalidade de centralizar a malha ferroviária paulista.
Nessa ocasião, o transporte de passageiros já havia diminuído bastante, com a concorrência do transporte rodoviário, muito mais veloz.
A partir de 1995, no bojo de uma política de privatização de empresas públicas federais, estaduais e municipais, chegou a vez da FEPASA. A empresa paulista, após ter sido integrada à FERROBAN, teve suas operações assumidas pela América Latina Logística ALL, em 1998.
Na hoje triste e solitária plataforma da estação ferroviária, restaram os ecos de um passado rico em movimento que as páginas dos jornais locais documentaram.
José Carlos Neves Lopes ( [email protected] ) é diretor técnico da CENP/SE, colaborador do www.movimento.com e editor do Guia de Ópera do www.sobresites.com